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‘Escolas representam pouco risco de propagação do coronavírus’, diz infectologista francês

Crédito: Sharon Mccutcheo/Unsplash

No dia 11 de maio, com o fim do confinamento na França, as escolas de todo o país foram autorizadas a reabrirem as portas para acolher uma parcela de seus alunos. De forma gradual, foi permitido que as crianças mais jovens, com idade entre três e dez anos, voltassem às aulas. Na semana seguinte, os mais velhos, com até 12 anos, também puderam retomar à rotina acadêmica, caso fossem residentes de regiões onde a circulação do coronavírus é baixa e a capacidade hospitalar se mantém alta. 

Embora possa parecer contraditório liberar com prioridade as crianças com baixa idade e, portanto, menos maturidade para seguir as regras de higiene que fazem parte da nossa rotina desde o início da pandemia, a decisão foi tomada pelo governo com base em alguns argumentos. O primeiro deles é permitir que pais e mães voltem a trabalhar fora de casa tendo onde deixar o rebento durante o dia, já que se trata de uma faixa etária que não tem condições de ficar sem o cuidado de um adulto. Vale lembrar que a França é um país onde as escolas funcionam em período integral e que tem uma cultura sem babás dentro de casa. Reabrir as escolas significa, portanto, liberar profissionais para voltarem a movimentar a economia. 

Além disso, ao contrário do que se pensava no início da crise sanitária, acredita-se que as crianças pequenas, com menos de 10 anos, oferecem pouco risco de contágio aos outros. “As escolas definitivamente não são um epicentro da epidemia. Pelo contrário, estamos percebendo que a infecção é pouco presente nesse ambiente”, diz o infectologista Pierre Tattevin, presidente da Sociedade de Patologias Infecciosas da França e professor do Centre Hospitalier Universitaire de Rennes. Ainda assim, o retorno à escola se manteve como uma opção facultativa para os país – em tempos normais, a escolarização é obrigatória a partir dos seis anos.

Para realizar a reabertura das escolas, os estabelecimentos de ensino, em parceria com as prefeituras municipais, tiveram de enfrentar um verdadeiro desafio para obedecer às regras sanitárias exigidas pelo governo. A principal delas foi gerenciar o limite máximo de alunos permitidos em classe: 15 (geralmente as turmas são compostas pelo dobro, o que significa que muitos tiveram de continuar em casa). A prioridade foi dada aos alunos cujos pais precisam sair para trabalhar. Além disso, as medidas de higiene e distanciamento social devem continuar sendo aplicadas, o que não é nada fácil. As crianças com menos de sete anos, por exemplo, não foram consideradas aptas para utilizar uma máscara – não pela questão de segurança, mas pelo simples fato de que seria difícil fazê-las seguirem todos os protocolos de higiene necessários para utilizá-las, como não tocar no rosto, por exemplo. 

Na França, escolas têm política de tempo integral, já qCrédito: August de Richelieu/Pexels

Algumas prefeituras decidiram simplesmente não reabrir as escolas, ou não aceitarem a presença de alunos com menos de quatro anos, diante de tamanho desafio. Foi o caso dos estabelecimentos com pouca área externa, por exemplo, cientes da dificuldade de oferecer uma pausa para o recreio com espaço suficiente para evitar aglomerações. Já nos locais que reabriram, os momentos de lazer se tornaram mais solitários, alguns professores desenharam quadrados no chão do pátio para que as crianças respeitassem o limite de distância em um momento onde, normalmente, deveriam brincar juntas.

Também houve o caso de instituições de ensino que passaram a oferecer aula duas vezes por semana, alternando grupos de alunos. Como de costume na França, as crianças almoçam nas escolas. Mas, com a epidemia, alguns locais aboliram a cantina, onde os alunos de todas as idades costumavam se reunir, e fez com que cada classe realizasse a refeição na própria sala de aula, em suas carteiras devidamente separadas com um metro de distância. 

Ainda na primeira semana de reabertura das escolas, alguns obstáculos surgiram desde cedo. Foi o caso de 70 estabelecimentos que não puderam acolher os alunos por conta de casos suspeitos de Covid. Seguindo o protocolo atual, todas as pessoas envolvidas tiveram de ser testadas e isoladas. Resta ainda pouco mais de um mês até o início das férias de verão, que duram cerca de oito semanas. Até lá, é possível que outros estabelecimentos sejam obrigados a fechar provisoriamente por razões sanitárias. Mas, ao menos, a vida volta um pouco ao normal. “É preciso seguir em frente e a vida escolar é um dos passos para isso”, diz Tattevin. 

Carolina Melo
Jornalista e vive em Rennes, na França, desde 2016